Um grande jornalista

O casamento com Ismênia

Está fazendo 60 anos. O dia provável é 27 de dezembro, no cenário vasto da Praça da Sé e da Praça Clóvis, ainda não unidas pelo metrô. O menino pequeno (eu) tenta acompanhar os passos largos do irmão mais velho, atravessando a área central de São Paulo em direção à loja que funcionava como terminal dos ônibus que desciam a Serra do Mar, na ligação com Santos pela Via Anchieta.

Depois de mais um ano internado no seminário dos padres paulinos, na Rodovia Raposo Tavares, o menino ia passar pouco mais de 20 dias de férias com a família, no chalé humilde do Marapé. Por isso, não poderia estar mais feliz, alvoroçado ainda pela companhia do irmão que era também o ídolo dele. Talvez aqueles momentos tenham sido os mais alegres da minha vida.

Aos 22 anos, Ouhydes João, o primeiro dos 12 filhos do casal perfeito formado pela Bela Dolores e pelo Bom Fonseca, estava perto de se diplomar pela então Escola de Jornalismo da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade Católica de Santos. Durante a faculdade, foi presidente da União dos Estudantes de Santos. Formado, iniciou-se na profissão como repórter de A Tribuna, antes de ser convidado a trabalhar no Jornal da Tarde (Grupo Estado).

A trajetória que se seguiu fez dele um dos melhores jornalistas brasileiros, com passagens pelas principais redações, entre elas Estadão, Jornal do Brasil e TV Globo, nos mais diversos cargos. Ouhydes dominava todas as habilidades próprias do jornalismo, com apurado faro de repórter, texto impecável, noção total do que é notícia e notável senso estético no desenho das páginas da editorias que comandou. Era tão completo que naturalmente virou professor, um dos melhores, na avaliação das dezenas de profissionais que ajudou a formar. Mestre e doutor pela USP, foi vice-reitor da Universidade Católica de Santos.

É claro que a história aqui está sendo terrivelmente simplificada. O jornalista e professor foi muito mais do que isso. Foi também um impressionante organizador de eventos e um incansável criador de ações comunitárias. Jornais lançou os mais diversos, desde os tempos em que jogava no EC Rio de Janeiro, do Marapé, e produzia o mural informativo do time de futebol. Na crise do final dos anos 1970, que afetou drasticamente o mercado de trabalho, organizou a Cooperativa dos Jornalistas, reunindo os companheiros desempregados.

Na editoria de Esportes de A Tribuna, lançou a mais espetacular competição estudantil do país, os Jogos Universitários da Baixada Santista, Jubas. Secretário de Esportes da administração Telma de Souza, criou a primeira escola municipal de surf, junto com Picuruta Salazar. Ouhydes nunca parou, e a atividade incansável foi sua razão de viver. Por isso, declinou fisicamente quando levado a uma aposentadoria precoce e indesejada.

Hoje, quando completa 82 anos de idade, o mano querido vive cercado pelo carinho de suas mulheres. A esposa Ismênia e as filhas Rachel, Natasha e Larissa.

Fotos não mentem

 

 

Na campanha da reeleição de 1998, o então presidente Fernando Henrique Cardoso, aceitou o apoio de Paulo Maluf em troca da alguns outdoors da dupla na cidade de São Paulo. Detalhe sórdido, mesmo considerados os padrões da política brasileira: o adversário histórico disputava o governo do Estado contra Mario Covas, companheiro de partido de FHC e também candidato à reeleição.

Quase duas décadas depois, Lula levou Fernando Haddad, seu indicado a governador, à casa de Maluf. O ex-governador declarou apoio pessoal e de seu Partido Progressista ao petista e o encontro foi registrado em fotos fartamente divulgadas. Adversários em diversas campanhas eleitorais, Maluf e Lula protagonizaram algumas das maiores baixarias ao vivo na TV, mas apareciam felizes e sorridentes, como convém à hipocrisia dessa gente.

Haddad conseguiu ser ainda mais falso na campanha seguinte à Presidência. Compareceu à missa na Basílica de Nossa Senhora Aparecida ao lado da vice comunista Manuela D’Ávila, ambos ateus, e foi recebido com pompa e circunstância pela hierarquia católica local. Em outra missa, o petista comungou, para confirmar que candidato renega a mãe, se ganhar alguns votos com isso.

Fotos costumam ser devastadoras na política. Muitas vezes, servem a interesses momentâneos, mas podem virar inimigas quando resgatadas dos arquivos. Nesse sentido, algumas das mais chocantes foram tiradas em Paris, na noite de 14 de setembro de 2009, num hotel da Avenida Champs-Élysées. As cenas dispensam legendas. Reúnem destacadas autoridades cariocas da época, aliadas do PT, e empresários vinculados por contratos de serviços e obras ao governo do Rio.

Foi a chamada “farra dos guardanapos”. Seu personagem principal, governador Sérgio Cabral, está hoje preso, condenado a mais de 300 anos.

 

É demitir ou cair

Neste sábado, dia do aniversário do Rei, estive na Vila vendo o Santos x América-MG e lembrei-me de uma noite no final dos anos 1990, no antigo Palestra Itália, onde jogavam Santos e Vitória-BA, pelo brasileirão. Lá, como na Vila, minha posição nas cadeiras do estádio do Palmeiras permitia acompanhar a movimentação no banco santista. Foi quando percebi algo estranho.

Após um ataque frustrado do Peixe, o ponta Alessandro, nosso melhor atacante, olhou para o banco e recebeu um sinal do técnico Vanderlei Luxemburgo. Imediatamente, caiu no chão, simulando contusão, e foi substituído. Nunca mais vestiu a camisa santista e foi jogar no Japão.

Anos depois, Luxemburgo repetiu a dose com o zagueiro Alex, ídolo da torcida. Já vendido para um time holandês, o jogador permaneceu mais alguns meses no Santos, mas nem banco pegou, por alegada falta de condições físicas. O técnico não admitia escalar jogador já vendido. Não sou fã de Luxemburgo, mas das malandragens do futebol admito que ele sabe tudo.

Carille fez o contrário. No fim do primeiro tempo, substituiu o machucado Camacho pelo meia Jean Motta, jogador negociado com um time norte-americano. Faltava um minuto para o intervalo, mas foi tempo suficiente para Motta fazer a lambança que derrotou o Santos. Num contra-ataque, perdeu na corrida, derrubou o atacante, cometeu pênalti e foi expulso de campo.

O gol mineiro encerrou a etapa inicial do jogo. No reinício, o goleiro santista entregou o segundo gol para o América. João Paulo não era para estar lá. No jogo anterior foi substituído com larga vantagem pelo reserva Jeandrei. Mas o treinador de novo decidiu errado, assim como fez ao prestigiar Pará. Antes, por falta de opção, ele tinha colocado um atacante medíocre na posição.

Deu nos nervos acompanhar a desorientação do técnico até o fim do jogo. Perdido, ele não sabia o que fazer. Chegou a deslocar o péssimo Felipe Johnatan para a meia, entre outras inúteis tentativas de modificar o destino do jogo.

Na saída, levou nas costas o mais vergonhoso desempenho de um técnico recente no comando do time: em nove jogos, uma única vitória, com quatro empates e outras quatro derrotas. E o time que no comando anterior aproximou-se da classificação para a Libertadores, caiu para a zona do rebaixamento.

Não costumo apoiar o afastamento de treinador antes do fim do contrato. Mas tantos erros como os de sábado e a sequência de maus resultados colecionados por Carille deixam a diretoria sem opção. A situação é crítica e algo radical o clube precisa fazer para evitar a tragédia do rebaixamento.

 

 

 

“Outubro, 17”

Hoje esqueço o boné

Com que me cubro.

Pois é outubro

E o verão se insinua

No céu, na rua.

No ar, até!

 

Apogeu vermelho das pitangas!

 

Outubro do sangue

Rubro, remoto na neve,

Que aqui não ferve.

E lá abunda.

Revés do nosso sol

De alma branda.

 

Revolta amável dos de tanga!

 

De novo outubro.

E se a cabeça ora descubro,

Quisera liberar igual

Os pés das vestes,

Para pisar o mal sem dor,

Subir mil everestes!

 

São Paulo, 17/10/2017

Querem militar e mentir? OK, mas não envolvam meu time

Domingo à noite, voltei pra casa em São Paulo feliz com a vitória do Peixe sobre o Grêmio, na Vila, a qual sofri e comemorei in loco, o lado de minha filha Mariana. Pressentia a continuação do feriadão gostoso, até ficar sabendo da mentira lançada pelo grupo falha, que começava a crescer nas rodas eletrônicas da esquerda, àquela altura ampliada pela cumplicidade dos demais veículos da velha mídia. O presidente, segundo a mentira espalhada, tentou entrar no estádio para ver o jogo e foi barrado pela diretoria santista por não ter tomado a vacina.

O “fato” imediatamente transformou o Santos no time queridinho de todas as torcidas. Uma espécie de Renan Calheiros da política corrupta, o mais novo heroi dos adeptos da volta do quadrilhão ao poder. Ao receber a “informação”, logo identifiquei mais uma narrativa falsa, tão comum nestes tempos de jornalismo militante. Não votei e não pretendo votar em Bolsonaro, mesmo que não haja opção melhor do outro lado. Mas invencionice tão porca me tirou do sério.

Senti-me como o telespectador que a Globo tenta fazer de idiota todo dia com a sordidez de sua campanha eleitoral. Eu acabara de voltar da Vila e não percebi no entorno do estádio qualquer movimentação que prenunciasse a presença do presidente. Pelo contrário, o local estava mais calmo do que de hábito, justamente por causa da pandemia e o meu portão de acesso era justamente o que supostamente Bolsonaro usaria, caso comparecesse de fato ao jogo.

Como, então, o presidente teria sido barrado pela diretoria do Santos? O que reforça o tom farsesco da narrativa é que a tal exigência de vacinação não partiu do clube, e o protocolo abria brechas para outras formas de comprovação (mais eficazes) da ausência de covid. Lembrei imediatamente da pizza na calçada de Nova York outra vergonha da nossa vergonhosa mídia.

Há dois anos, no primeiro do seu governo, o presidente foi assistir a um jogo em Urbano Caldeira, naquela tarde lotado. A movimentação pela anunciada presença de Bolsonaro era visível. Falava-se que as torcidas organizadas santistas lhe dariam uma recepção hostil, mas não foi o que aconteceu. Com exceção de um grupo da Torcida Jovem, o público ovacionou o presidente, que se instalou no camarote principal, ao lado dos dirigentes do clube pouco antes do início do jogo. No intervalo, ele desceu e fez o corpo a corpo com os associados das cativas e das cadeiras especiais, bem no estilo que vem mantendo em todas as ocasiões.

Domingo, o que me irritou não foi o surgimento de mais uma mentira produzida e reproduzida pela velha mídia, porque o comportamento indecente dessa imprensa não mais surpreende. Virou mau hábito. Do que não gostei foi ver meu time indevidamente envolvido na sordidez dessa disputa nojenta, quando só o que quero é curtir as alegrias que o Peixe me proporciona em campo.

O jogo começa agora

Meses atrás, um funcionário público, professor de universidade paulista, pago com o nosso dinheiro, escreveu no jornal em que mantém coluna desejar a morte do presidente da República. Não foi força de expressão. Ele usou todo o seu precário talento de redator (costumo dizer que nossos mestres das humanas escrevem pior do que pensam) para deixar claro que deseja mesmo a morte física de Bolsonaro. Já corriam soltos os nebulosos inquéritos do inacreditável Xandão do stf, ou do pcc, mas nada aconteceu com o professor.

Nesse meio tempo, um deputado federal foi preso por expressar opiniões fortes, embora sem condenar ninguém à morte e respaldado por suas imunidades constitucionais. E pelo menos dois jornalistas foram colocados atrás das grades pelo “crime” de exercer a profissão num país em que supostamente há liberdade de imprensa. Quem mandou prender foi o mesmo Xandão, aquele que ficou paralisado ante a retórica do valente professor pago pelo nosso bolso.

Semanas depois, outro colunista do mesmo jornal defendeu um golpe de estado, contra o presidente legitimamente eleito. Na verdade, o sujeito pregou algo ainda mais tenebroso, ao usar como modelo um fato histórico da segunda guerra mundial conhecido como Operação Valquíria. No episódio, um grupo de oficiais do Terceiro Reich preparou atentado contra a vida de Adolf Hitler. Fracassou.

Na versão brasileira imaginada pelo militante do núcleo resistente do jornal que colaborou com o golpe militar dos idos de 1964, oficiais das Forças Armadas deveriam matar o presidente e aplicar o golpe de Estado. De novo, Xandão achou normal a exortação do colunista. Neste caso talvez por conhecer a história da maior barriga (atual fake news) publicada na mídia impressa brasileira, cujo autor foi exatamente o atual conspirador das pretinhas.

A história é a seguinte. Às vésperas da Copa de 2014, o valoroso repórter entrevistou um sósia do técnico da seleção brasileira e publicou matéria no jornal como se tivesse falado com Felipão. Um vexame inacreditável para um veterano das redações. Por isso, Xandão pode ter considerado o colunista inimputável.

Tratamento diferente foi dado ao presidente nacional de um de nossos partidos políticos e a um ídolo da música sertaneja, estes alinhados entre os que defendem o respeito à Constituição. Não surpreende, pois Xandão das candongas e a maioria de seus cúmplices de toga sentem-se investidos da missão de derrubar um presidente eleito pela vontade dos brasileiros. Para isso, dane-se a Constituição. Eles não têm um voto, não conseguiram passar em concurso para juiz, mas acham que podem afrontar a nação.

Apoiada pela banda mais corrupta do Congresso, pelos negaceios da cpi malandra e pela mídia que abdicou de praticar jornalismo de verdade para dedicar-se à militância partidária, nossa desqualificada corte vai brincando de cometer arbitrariedades, de pisotear as leis e de ensaiar o golpe que, insanamente sonham, levará à ditadura para a qual trabalham sem descanso.

No fim do primeiro tempo, parecem ganhar de goleada.

Aguardemos, porém, o fim do jogo.

A balela da luta pela democracia

Vivemos uma ditadura entre meados dos anos 1960 até o início dos 80 do século passado. Começou com o golpe militar, que em 1964 derrubou um presidente legitimamente eleito (na época, os vices tinham votação própria, e foi nessa condição que o deposto João Goulart chegou ao poder, pós renúncia do presidente Jânio Quadros), em movimento semelhante às quarteladas latino-americanas. O golpe, entretanto, só se transformaria em ditadura de fato em dezembro de 1968, com o Ato Institucional número 5. Foi então que os militares tiraram a máscara do regime que impunham ao país, com o apoio de muita gente boa, inclusive a chamada grande mídia.

A penada fechou o Congresso, extinguiu os partidos políticos, controlou o Judiciário, tornou ilegais as instituições que se opunham ao sistema, cassou mandatos e afastou da vida pública os políticos de oposição, além de prender estudantes, intelectuais e sindicalistas. Iniciou-se, também, um período de censura à imprensa, em alguns casos com o censor fazendo plantão nas redações. Tal situação levou parte dos opositores do regime a buscar a resistência armada, enquanto outros acreditavam que, contra todas as restrições, a luta poderia manter-se no campo político. Tudo isso é história. Nem precisaria recontar, mas serve para o paralelo que pretendo estabelecer.

Hoje, ouço e leio pessoas declarando-se na resistência à ditadura e em luta pela democracia no País. Acreditam fazer parte de uma cruzada heroica. Mas a principal arma de que dispõem é um discurso feito de lugares comuns, denúncias vazias e argumentos insustentáveis, posto que baseado em naturais diferenças político-ideológicas. Sua irritação mais profunda volta-se contra a postura de um governo nem sempre coerente com sua plataforma eleitoral (o combate à corrupção parece ter sido esquecido, por exemplo), mas que quase nada difere daquela que o levou a ser preferido por expressiva maioria do eleitorado. A bandeira dos “resistentes” é a derrubada de um presidente eleito de forma legítima, tal como os militares de 1964 fizeram com Jango.

Se o governo foi democraticamente eleito e, dois anos depois, os demais poderes (Legislativo e Judiciário) funcionam em toda a plenitude, por vezes até usurpando atribuições de Executivo, e nenhuma instituição da sociedade civil teve suas atividades encerradas, como falar em ditadura? Pois é, estranha tirania que se permite a todo momento ser desafiada e derrotada no embate político que transcorre normalmente. Verdadeira jabuticaba na cena mundial das ditaduras.

Sem falar no ridículo mantra do genocídio, curiosa é também a queixa de uma intelectualidade contra suposta censura à imprensa e imaginária ausência de liberdade de expressão. Isso é quase uma anedota. Os veículos de comunicação, grandes e pequenos, impressos e eletrônicos, na grande maioria fazem oposição militante ao governo e não sofrem qualquer represália. Jornalistas, artistas e escritores dizem e  assinam o que lhes vai pela cabeça, com total sem cerimônia. Um colunista chegou a escrever e publicar que torce pela morte do presidente da República. O STF, que procura “discursos de ódio” para alimentar seu inconsistente inquérito a respeito, comeu mosca. Não se emocionou com essa explícita demonstração de ira. Deixou para lá.

Então, vamos combinar. Fazer oposição a um governo que não escolheu, tudo bem. Procurar todos os argumentos possíveis para enfraquecer um futuro adversário nas urnas, tudo bem. Faz parte do jogo político. O que não cola é essa pretensa defesa da democracia num país em que todas as instituições funcionam sem sustos. O que não pega bem é reclamar de censura quem pode manifestar-se livremente, alto e bom som, inclusive para de forma inédita (porque exclusiva do nosso país) responsabilizar o presidente por uma epidemia mundial. O que não existe por aqui, e agora, é tentativa de se criar algum tipo de controle social da mídia, ameaça que só foi real nos governos lulopetistas.

E são justamente os apoiadores dessa excrescência e os defensores de ditaduras como as de Cuba e Venezuela os que mais criam fantasmas. É o que fazem para se sentir intrépidos resistentes. Mas no fundo, o que os pobres diabos aspiram é o golpe, quando deveriam estar apenas estar se preparando para disputar com competência o voto dos brasileiros na próxima eleição.

O ano mais vergonhoso da mídia militante

Nos próximos dias, talvez logo depois dos fogos do révèillon, a grande mídia vai comemorar a marca dos 200 mil brasileiros supostamente mortos em consequência da pandemia. Será mais uma grande oportunidade para a imprensa militante chamar presidente da República de genocida e de responsabilizá-lo por um mal que veio de fora, que atingiu todos os países e que em nenhum lugar foi combatido de forma mais efetiva. Nossos sucessos e fracassos foram semelhantes ao que se viu por toda parte.

Nada disso importa para as Organizações Globo e o Grupo Folha. O causador do infortúnio é o presidente. Mesmo que até o mais distraído javanês saiba que, no Brasil, a justiça atribuiu a governadores e prefeitos a responsabilidade pela contenção da covid-19. Ao governo central cabe entregar recursos financeiros para os delírios das autoridades regionais. E, claro, para a velha e boa corrupção.

Sobrou dinheiro para a importação de caríssimos ventiladores pulmonares que não chegaram (ou chegaram com defeito) e para a instalação de hospitais de campanha pouco ou nada utilizados, e logo fechados. Sobrou dinheiro para a abertura de milhares de covas e a compra de caixões funerários, apenas para fazer figuração no Jornal Nacional.

O mesmo papel coube aos caminhões frigoríficos estacionados nos pátios de alguns hospitais, alegadamente para a conservação de cadáveres. Segundo o pânico disseminado pela grande mídia e por um insano ministro da Saúde, não haveria como guardá-los antes do enterro, tantas seriam as mortes. Também este agouro, felizmente, não se cumpriu.

No início do ano, o presidente deu uma declaração a respeito da doença. Disse que no caso dele, por ser um cidadão saudável, a contaminação se manifestaria na forma de uma gripezinha. A declaração está gravada e não dá margem a dúvidas. Bolsonaro falou dele. Mas a grande mídia distorceu a fala presidencial da forma calhorda. O insensível presidente teria minimizado a pandemia.

A Globo, por exemplo, nem se deu conta de que Bolsonaro apenas repetiu, limitada à sua pessoa, e não generalizando, declaração feita antes pelo consultor principal da emissora para questões de saúde. O Dr. Dráuzio Varella sim diminuiu o mal chinês, ao dizer que ele provocaria “resfriadinho”. Também está gravado, para quem quiser conferir.

Há dias, falando da ansiedade geral pela vacina, o presidente afirmou não ligar para as pressões pela liberação sem critério e, acima de tudo, sem a aprovação da Anvisa. De novo, a grande mídia deturpou miseravelmente o discurso. Na telinha e nas páginas dos jornalões, Bolsonaro teria dito que não está nem aí para a aflição das pessoas. Trata-se, como se vê e como se viu ao longo do ano, ou melhor, desde que as urnas de 2018 contrariaram as expectativas da esquerda, do jornalismo mais vergonhoso já praticado no país

Atravessamos a agora chamada primeira onda da crise sanitária com a população aterrorizada pelas orientações dos cientistas engajados (aqueles que sabem exatamente o que precisam dizer para ter seu instante de fama na televisão) e paralisada por medidas autoritárias dos governos regionais. À doença somaram-se desocupação generalizada, fechamento de milhares de empresas e aviltamento da renda das famílias, entre outras mazelas.

Quem teve de socorrer essa população, vítima do desvario de governadores e prefeitos, foi o governo federal. Rapidamente, criou-se um programa emergencial em todos os aspectos superior ao assistencialismo dos governos anteriores. Dessa forma, evitou-se a tragédia maior arquitetada por gente como o governador paulista João Dória, apenas para se opor a Bolsonaro.

Agora, na dita segunda onda da pandemia, voltam o alarmismo da grande mídia e o repeteco de medidas que não funcionaram antes e que hoje são renegadas até pelos patrocinadores da OMS. A reclusão e o isolamento, retifica a organização, são formas equivocadas de proteger a população.

De novo, nenhuma surpresa. As autoridades regionais só estão preocupadas em se cacifar para as próximas eleições, enquanto a grande mídia dedica-se a procurar picuinhas que possam atazanar o presidente, para seguir militando. Pedir que faça jornalismo (o que é isso?) é exigir demais, se atingiu o fundo do poço e hoje serve ao mais sórdido ativismo político.

As flores e os espinhos

Pelé em 1957

Foram imensas as homenagens pela passagem dos 80 anos de vida do Pelé. Um porre gostoso, como os melhores porres. Eu mesmo perpetrei a minha homenagem, neste tãoSantista. E acrescentei a indefectível foto com Pelé 10. Por falar nisso, as fotos brotaram feito maria-sem-vergonha no meu quintal. Deu a impressão de que todo brasileiro foi fotografado ao lado do Rei.

O feito lembra o público declarado daquele Juventus x Santos de 50 anos atrás, na Rua Javari, Mooca, São Paulo. Naquele dia, o Rei marcou o gol que considera o mais bonito da sua carreira. O gol da fieira de chapéus sobre quatro defensores juventinos, entre eles, e derradeiro, o goleiro Mão de Onça. O único registro do lance é a foto histórica de Rafael Dias Herreira, de A Tribuna. O jogo não foi gravado em filme e o VT é posterior.

Entretanto, talvez não seja preciso mais do que o clic do grande fotógrafo santista, tanto quanto foi desnecessária a recriação eletrônica feita pela equipe técnica do filme Pelé Eterno. Pois as imagens do moleque de branco passando como Pantera Negra sobre a zaga grená estão bem vivas na retina e na mente do público extraordinário que teria ultrapassado em pelo menos 100 vezes os quatro mil lugares do velho campo.

Inacreditável? Eu, pelo menos, ainda não encontrei um amante do futebol com idade suficiente que não declare presença na icônica partida. Por isso, faço o cálculo aleatoriamente, como um míssil do nosso Marinho. Assim sendo, trata-se de imbatível recorde mundial, consideradas todas as competições, até finais olímpicas e decisões de mundiais de futebol, passadas e futuras.

Pelé é imbatível até nas lendas criadas em torno dele.

Mas não apenas flores, afagos e aplausos recebeu o Rei em seu aniversário. A data fez ressurgir também a ira que muitos lhe dedicam desde o episódio controverso do não reconhecimento de uma filha. A opinião pública, como sempre manipulada pela parte irrecuperável da mídia nacional, tendeu em parte a ficar ao lado da moça que, décadas depois, decidiu reclamar o amor do pai.

O caso, porém, por todo ângulo que se analise, dos sentimentos humanos ou religiosos à letra fria da lei, não comporta julgamentos finais implacáveis. Possivelmente, há acertos e equívocos dos dois lados. Um amigo que diz conhecer todo o processo assegura que o jogador (para mim, nunca será ex, porque parece estar entrando em campo agorinha mesmo) é o menos errado na história. Confio no Zé Guido, mas admito que possam haver outros entendimentos.

O que não aceito é a condenação moral definitiva, decretada por gente que se diz movida pelo mais genuíno espírito cristão. Nos últimos dias, li execrações inacreditáveis. Pelé seria um péssimo ser humano, indigno do tratamento de ídolo que recebe. Avessas ao espírito cristão de que se dizem possuídas, essas pessoas sentem-se em condição de lançar contra ele não só a primeira, mas dezenas de pedras, com ódio só comparável ao de Jesus expulsando vendilhões do templo.

Da minha parte santista roxo, continuarei agradecido e idolatrando o Rei. Adepto do errar é humano, seguirei gostando do Edson, a quem me igualo na falibilidade e nas faltas graves ou não que cometo todos os dias. Isso não é advogar em causa própria. É sentir a possibilidade de ser um pouco Pelé.