CONVERSA COM O CAPITÃO (I)

Caro Zito,

Você é meu ídolo desde os inesquecíveis domingos da segunda metade dos anos de 1950, em que meu pai – o Bom Fonseca – conseguia colocar seus pirralhos para dentro da Vila, sem poder curtir com os próprios olhos, por absoluta falta de grana, sua segunda maior paixão. Segunda porque o primeiríssimo lugar era ocupado pela Bela Dolores, mãe de seus doze filhos, alguns deles provavelmente gerados simultaneamente a um gol do Santos.

Com tal produtividade, o casal não podia desperdiçar a súbita calmaria que se instalava no minúsculo chalé do Marapé, enquanto o Peixe dava recitais. De modo que parte da formação da nossa família humilde e feliz sem dúvida se deve à magia do time de branco.

Mas não estou aqui para falar da fonsecaiada. Estou aqui para encher a sua bola, Zito. Você é meu ídolo, o maior da história do Santos, na parte que conheço, a partir da segunda metade dos anos de 1950. Para mim, você está acima do Rei e dos que vêm a seguir. Entre outros, as equipes inteiras daquela época; a trinca de dirigentes formada por Athié, Roma e Moran; os treinadores Lula e Antoninho Fernandes; e os recentes Giovanni, Diego, Robinho e Neymar. Todos eles ajudaram a construir a mística do Peixe. Para mim, porém, você é um pouco mais.

É, por exemplo, o mais importante jogador brasileiro. Não é heresia. Pelé, sem dúvida, é o melhor de todos os tempos. Mas foi sob o seu comando que o menino Gasolina virou Pelé, que o Santos transformou o jogo da bola em fantasia e que a seleção livrou-se do complexo de vira-lata. Daí sua inigualável importância, Zito.

As novas gerações talvez não saibam, mas até o Mundial de 1958 o Brasil não ganhava nada. Jogava bem, empolgava as plateias … e perdia sempre. Aqui mesmo, no sul da América, era freguês de carteirinha de uruguaios e argentinos. Tudo mudou quando você assumiu a liderança do escrete nos campos da Suécia, e fez o que fazia no Peixe: ensinou que era possível jogar bonito e ganhar.

Há quem atribua esse papel a Didi e Nilton Santos, também magníficos futebolistas. Só que eles representavam em linha direta as gerações perdedoras de 1950 e 1954. Aquelas que sucumbiram diante da força de Obdulio Varella e da fantástica equipe húngara. Outros dirão: ah, mas na Suécia tivemos Garrincha e Pelé. E eu responderei que nunca nos faltaram craques. O que faltava era você, Zito. A novidade de 1958 foi o comando do seu espírito vencedor.

(continua)

Publicado por

Marcão

Jornalista aposentado, casado, duas filhas, um neto, dois poodles e nove irmãos. Santista de mãe, pai, cidade, time e o que mais bem qualifique essa condição. Sem vaidade, só verdade!

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