Foi o capitão Zito quem acabou com o “complexo de vira-latas” e mostrou à seleção brasileira que é possível jogar bonito e ganhar
O jornalista Odir Cunha defende a tese – verdadeira, inquestionável – de que o Santos de 1962-1963, com sua formação clássica (Gilmar, Lima, Mauro, Calvet e Dalmo; Zito e Mengálvio; Dorval, Coutinho, Pelé e Pepe) foi o maior time do futebol mundial em todos os tempos. De fato, naquele período, o Peixe ganhou todos os títulos possíveis, bateu as maiores equipes europeias e sul-americanas, aplicou a mais sensacional série de goleadas por onde passou.
Foi um momento mágico do futebol mundial em que se demonstrou ser possível unir a eficácia ao espetáculo. O show ao resultado. O Santos não apenas jogava bonito, como nenhum outro time jogou antes ou jogaria depois, mas também ganhava as competições que disputava.
A seleção brasileira também teve um momento assim, quatro anos antes, na Suécia. Ao ganhar a Copa do Mundo pela primeira vez, os brasileiros aplicaram históricas goleadas contra seus adversários na semifinal, contra a fortíssima França, e na final, contra a equipe anfitriã.
Para quem acha que uma coisa (a arte) leva necessariamente à outra (a conquista), os desmentidos são inúmeros: a fantástica seleção húngara de 1954, batida na final da Copa pelos alemães; a revolucionária Holanda de Rinus Mitchels, que maravilhou o mundo em 1974 e perdeu o Mundial para a mesma Alemanha; e o Brasil de 1982, bonitinho mas ordinário. Os exemplos contrários – dos times sem charme mas vencedores – também são inúmeros, mas fiquemos com dois: a citada Alemanha de 1954 e o não-Brasil de 1994.
Tudo isso para dizer que também tenho uma tese: se Pelé foi o maior jogador de futebol de todos os tempos (e não me falem em Maradona, pelo amor de Deus), Zito foi o mais importante. É claro que a segunda afirmação não é tão fácil de sustentar. Mas também tenho meus argumentos, a começar pelo fato de que esses dois jogadores são o traço de união entre o Brasil campeão do mundo em 1958 e o Santos ganhador de tudo em 1962 e 1963. Nesses dois inigualáveis times, Pelé era a genialidade e Zito, o grande condutor.
O dramaturgo Nélson Rodrigues criou uma imagem para explicar a razão pela qual, até 1958, o Brasil jogava bonito mas não ganhava nada. Aqui mesmo, no cone sul da América, éramos fregueses de caderneta de argentinos e uruguaios, que nos surravam impiedosamente. Personalidade fraca? Baixa estima? Para o escritor, sofríamos de insuperável “complexo de vira-latas”.
Pois bem. Quem mudou essa história foi o nosso Zito. Foi ele quem transformou um time de cidade pequena, o Santos, no melhor e mais forte de São Paulo, do Brasil e do mundo. E foi ele quem deu caráter e espírito a uma seleção até então comandada por expoentes dos fracassos de 1950/1954, como Nílton Santos e Didi.
Zito foi a grande diferença de 1958. Só com Pelé e Garrincha, talvez a história se mantivesse. Foi ele quem mostrou aos companheiros que, além de jogar bem, poderiam ser vitoriosos. Não precisavam perder sempre. Zito odiava perder e, em toda a sua carreira, perdeu pouco. O ponto de vista carioca, que prevalece na crônica esportiva, perpetua a imagem de representantes das gerações perdedoras e esquece o nosso grande capitão. Aquele que não ergueu formalmente qualquer das taças, mas levantou definitivamente a cabeça do futebol brasileiro.