Santistas na noite mágica do tri
Tempos atrás, um programa esportivo, produzido e apresentado no Rio de Janeiro, recuperou uma pesquisa nacional feita pelo jornal carioca O Globo, no início de 1969, para medir a paixão dos brasileiros pelos seus times. Talvez tenha sido a primeira pesquisa do gênero, e o resultado é inquestionável. O Santos ficou em primeiro lugar, com 49%, seguido muito de longe por Flamengo (menos da metade), Corinthians (ainda mais distante) e um grupo composto por São Paulo, Vasco, Palmeiras, etc.
Do segundo colocado para baixo, todos somados não alcançaram a votação do Peixe. Uma vantagem tão grande, que o insuspeito jornal foi levado a admitir: o Santos é o time mais popular do Brasil!
Mesmo assim, os comentaristas cariocas da mesa tentaram relativizar. A pesquisa não perguntou pra que time os brasileiros torciam, alegaram. Quis simplesmente saber de que time os brasileiros mais gostavam. Papo furado. A grande “torcida” que o Flamengo sempre teve no Norte-Nordeste é formada por torcedores de times locais, os quais também simpatizam com o clube que revelou Toró, Fabão e Júnior Baiano.
Coisa pior, entretanto, estava por vir. E veio. Foi quando o apresentador mostrou uma escalação do Santos daqueles anos e perguntou: dá pra cravar que esse foi o melhor time brasileiro? A resposta óbvia é: “Não, Pedro Bó, esse não foi o melhor time brasileiro. Esse é o melhor time de todos os tempos no mundo!”
Mas os botafoguenses, foram rápidos: Não, não dá para cravar o Santos como melhor time brasileiro, disseram. “Jogador por jogador…”, começou um. “O Santos conquistou mais títulos, é verdade…”, emendou o outro. “Mas o Botafogo teve Garrincha, Didi, Nílton Santos…”, concordaram ambos, chegando afinal ao ponto. O que eles queriam era nivelar o Peixe ao seu grande freguês. Então, combinaram, ganhar mais títulos não seria critério para se medir superioridade, ainda que o Santos tenha conquistado todos os títulos e nada tivesse deixado para o suposto rival. E ainda que alguns desses títulos tenham decorrido de surras homéricas aplicadas justo nesse adversário. Foi muita cara de pau!
No quesito escalação, no qual os botafoguenses se consideravam em vantagem, a comparação é ainda mais risível, e cruel. O Santos anos 1960 teve Gilmar, Carlos Alberto, Mauro, Calvet e Dalmo; Zito (Clodoaldo) e Mengálvio; Dorval, Coutinho (Toninho), Pelé e Pepe (Edu). Com exceção de Dalmo, todos campeões com a seleção, todos detentores de títulos mundiais. Cada um muito mais vitorioso do que o mais vitorioso botafoguense. Nenhum deles, incluindo seus maiores ídolos, tem os títulos locais, nacionais, sul-americanos e mundiais que os santistas têm, inclusive Dalmo. E vários dos nossos “reservas”, os irmãos Ramiro e Álvaro Valente, Pagão e Lima entre eles.
Botafogo, além de ser hoje codinome de político corrupto, para mim é sinônimo de alegria. Desde a primeira vez em que vi os dois em confronto direto na Vila. Rio-São Paulo, 1957. O Santos de Dorval, Álvaro, Pagão, Del Vecchio e Tite enfiou 5 a 1 no time de Nílton Santos, Didi e Garrincha. Pelé entrou no fim. Tinha 16 anos e nem precisou marcar.
A visão regional da mídia esportiva sempre produziu ideias bizarras. Talvez, naquela mesa da TV, os comentaristas quisessem estabelecer a seguinte maluquice: o Santos foi o melhor time do mundo, mas na mesma época o Botafogo foi o melhor time do Brasil. Interessante! O problema é que o Botafogo, naquele tempo e em nenhum outro, sequer foi o segundo melhor por aqui. Já então, o Palmeiras tinha mais time e ganhava mais títulos do que o time carioca, que, como diz seu hino, é campeão de 1910.