O JN acha que somos Simpsons

Homer Simpson, a audiência do JN

Uma jornalista que admiro diz no facebook que tem evitado falar de política, por não ser “comentarista de circo”. A julgar pelo que se vê, do lado do governo e da oposição, ela está coberta de razão. Sortilégios. Ilusionismo e prestidigitação de lá e de cá. Eu, da minha parte, pretendo continuar escrevendo sobre o assunto, mas pelo viés da “cobertura” da chamada grande mídia, aquela que um grande jornalista considerava apenas negócio. Eu concordo e acrescento: não temos mais jornalismo nem imprensa. Temos o grande circo da mídia.

Também citando terceiros, alguém disse que o papel de oposição no Brasil foi assumido pelas grandes empresas de comunicação. Perfeito! Até o PT e as siglas de esquerda perceberam a inviabilidade de tentar derrubar o governo pelas vias legais. Por isso, colocaram mordaça em seus porta-vozes institucionais, embora Lula e os postes sejam quase sempre incontroláveis. Falando em nome próprio, e interessadíssimos no espaço aberto pelos jornais e meios eletrônicos a quem se dispõe a atacar o presidente, sobram parlamentares, governadores, ex-ministros, especialistas, pesquisadores e ruelas esperneando.

É que pode haver eleição este ano, vai haver eleição em 2022, e nada melhor do que aproveitar a mídia para fixar imagem e nome junto ao eleitor. Essa gente faz lembrar a dúvida do editorialista da imprensa antiga ao receber o tema do dia seguinte: é para escrever a favor ou contra? Hoje, a pergunta é desnecessária: se o assunto for o governo, o redator já sabe que posição assumir. Os políticos de oposição fazem igual, sabendo que falar mal do governo é senha para ganhar tempo na TV BBB, por exemplo.

Motivos para crítica ao governo não faltam, e nem há o risco de ter de enfrentar contradita. O que é confortável demais para a pobreza da argumentação que costumam exibir. É só colocar a culpa no atual governo por pequenos e grandes males. Queimadas, secas, enchentes, miséria, educação deficiente, saúde precária, desemprego, salário baixo, dólar alto, e toda a desgraceira que o messias teria conseguido produzir em poucos meses, sem qualquer contribuição de quem governou o país nos 16 anos anteriores. Como essa mitologia não convenceu a maior parte dos brasileiros, a situação já era de pânico nas redações, quando afinal a natureza, como diz Lula, fez o favor para a humanidade de criar o novo corona vírus.

Com a pandemia, ampliou-se o repertório. Se o governo socorre quem mais está perdendo com a doença e com a paralisação dos negócios, a ajuda é insuficiente ou demora a chegar. Se o número de contaminados e mortos segue crescendo, a culpa é do presidente, que deseja outra política de isolamento, sem o bloqueio total da atividade econômica, mas foi desautorizado pelo STF. Para os meritíssimos, cabe aos governadores e prefeitos (sem que se saiba quem detém a palavra final) decidir sobre as medidas a tomar para “proteger” o povo.

Falta comando e coordenação na luta contra a covid-19, acusam os presidentes da câmara e do senado, apoiados pelo presidente da alta corte da justiça e pela direção do noticiário global, que vê na conversa mole outro ataque supostamente eficaz ao presidente da República. Esse discurso, tão incoerente por vir justamente dos que tiraram comando e coordenação da esfera do Palácio do Planalto, condena de fato os escassos resultados que estados e municípios estão obtendo para conter a progressão da doença.

Na mídia eletrônica, o JN é o que mais se empenha em dramatizar a situação por si só dramática, com cenas de mortos, caixões e covas mortuárias e a insistência com os tristes relatos de pessoas que não conseguem internar ou já perderam seus parentes mais queridos. Faz o que antigamente se chamava jornalismo marrom ou mundo cão, achando que com isso pode transferir o poder da pandemia (que nenhum governo nas condições brasileiras conseguiu enfrentar com um mínimo de eficácia) para o presidente em exercício.

Quem vê o apresentador William Bonner, posando todas as noites de professor ou doutor na bancada do telejornal, não haverá de se surpreender, se conhecer o apreço que o jornalista tem pelos seus telespectadores. Anos atrás, ao receber um grupo de docentes, Bonner explicou o nível da linguagem e do conteúdo do noticiário. Segundo o jornalista, a audiência é formada por pessoas como o mais idiota dos Simpsons, e é para ela que a TV fala.

Não precisa ser mais claro!

Publicado por

Marcão

Jornalista aposentado, casado, duas filhas, um neto, dois poodles e nove irmãos. Santista de mãe, pai, cidade, time e o que mais bem qualifique essa condição. Sem vaidade, só verdade!

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