Com a bola parada, se a Globo chama reprise em horário nobre, também posso colocar minhas lembranças neste espaço. Volto 50 anos no tempo, para falar dos meses de maio e junho de 1970, quando a seleção ia para o México ganhar o tri, com decisiva contribuição santista, e o Peixe de Antoninho Fernandes juntava a garotada ao restante do time titular e viajava pelas Américas.
O time campeão da Taça Cidade de São Paulo
O Santos tinha oito titulares na seleção que, em 1969, classificou o Brasil para a Copa do México. No ano seguinte, porém, com a queda de Saldanha e a chegada de Zagallo, três santistas foram cortados: o goleiro Cláudio, já com problemas de saúde (morreria alguns anos depois, vítima de câncer), o lateral-esquerdo Rildo e o zagueiro Djalma Dias. Na verdade, por mérito, todos deveriam ter sido mantidos. Inclusive o goleiro, pois o botafoguense Rogério foi preservado pelo técnico, mesmo machucado. E ainda caberia o centroavante Toninho Guerreiro, em grande fase. Mas Zagallo não engolia o Peixe, que sempre surrava o Botinha dele, e acabou limitando a presença santista na Copa do México aos nossos cinco tricampeões: Joel Camargo, Carlos Alberto, Clodoaldo, Pelé e Edu.
Durante a Copa, sem essas cinco estrelas, o Santos excursionou pelas Américas. Foram mais de 40 dias entre América do Sul, América Central, Caribe e América do Norte (Estados Unidos e Canadá). Eu fui junto, como jornalista de A Tribuna. No dia da abertura da Copa (México x URSS, num domingo), estávamos em Nova York. O Santos jogou e perdeu da Inter de Milão, num Randall Island Stadium lotado pelas colônias italiana, portuguesa e cucaracha.
Teria empatado no fim, se o juiz não invalidasse um golaço de bicicleta do Douglas. O lance motivou uma eufórica invasão do campo pela torcida e acabou encerrando o jogo. Dias depois, em Toronto, demos o troco: 3 a 1. E seguimos por ali, entre EUA e Canadá, com a Copa rolando, sem que tivéssemos chance de assistir aos jogos. Também não sabíamos muito o que acontecia no México, pois na época as comunicações pessoais eram precárias e a imprensa local pouco espaço dedicava ao nosso futebol.
Aqui no Brasil, pela primeira vez uma Copa era transmitida ao vivo, ainda sem as cores, que só chegariam à nossa TV dois anos depois. Na América do Norte, o único jogo a que pudemos assistir foi Brasil e Inglaterra, num cinema de Toronto, repleto de torcedores da esquadra inglesa. Foi tensão do início ao fim e terminou com a belíssima vitória de 1 a 0.
Dois dias antes da final contra a Itália, o Peixe enfrentou o Milan, em Montreal, Canadá, num jogo que foi vendido para a região como uma prévia da decisão da Copa. Ganhamos de 1 a 0. No domingo da final no México, já estávamos na América Central, em San Salvador, onde o Peixe se exibiria contra um time local pouco depois do jogo no estádio Azteca. Ironia do destino, por causa da guerra com Honduras, que havia rolado ali, El Salvador era o único país de todo o continente que não recebia as imagens da TV mexicana. Ouvimos a decisão pelo rádio, transmissão em castelhano, em grupos espalhados pelos quartos do hotel
Só quando a vitória já estava assegurada e aproximava-se a hora de ir para o estádio, nos reunimos e comemoramos juntos. Era visível a decepção de Rildo e Djalma Dias de não estarem no México, àquela hora recebendo as faixas de campeões do mundo. Para piorar, ainda haveria uma partida na Costa Rica, antes da volta ao Brasil. De forma que, quando chegamos a São Paulo, lá pela quinta-feira seguinte, a seleção do Tri já havia voltado e as festas tinham terminado.
Treino no Central Park, em Nova York
O time da excursão tinha como base a equipe campeã de um torneio disputado entre os grandes paulistas, a Taça Cidade de São Paulo, durante a preparação da seleção para a Copa. Os rivais jogaram com sua força máxima, mas o campeão foi o time montado pelo técnico Antoninho Fernandes com vários jovens da equipe de aspirantes. Na viagem pelas Américas estiveram Joel Mendes (Edvar), Orlando Amarelo, Ramos Delgado (Paulo Davoli), Djalma Dias (Marçal) e Rildo (Turcão); Lima, Leo (Pitico) e Douglas; David, Picolé (Djalma Duarte) e Abel.
Também faziam parte dos times da época os meias Negreiros, Fito e Ibrahim, além do meia atacante Alexandre Bueno. Pelo menos um deles participou da excursão. Orlando Amarelo (Orlando Lelé, para os cariocas) e Picolé morreram muito jovens, assim como Djalma Dias, pai do Djalminha que, pra quem não sabe, é santista de nascimento. Djalma Duarte morreu aos 61 anos, em 2011. David era casado com a irmã do Pelé e o técnico Antoninho Fernandes foi um dos maiores craques da história do Peixe.