Paixões do Bom Fonseca: a Bela Dolores, a família e a cidade
Falou no Bom Fonseca, falou em Santos, Instituto Adolfo Lutz (repartição em que ele foi servente até se aposentar), centro antigo, cinemas de bairro, Marapé e José Menino. Em todos os lugares e cantos da Baixada Santista por onde circulou a pé ou de bicicleta, a trabalho ou lazer. Desde que nasceu na cidade, há 109 dias, no 19 de abril de 1911, ele foi acima de tudo santista.
Falou no Bom Fonseca, falou na Vila Belmiro, também centenária como o time que fez daquele lugar o seu palco preferido. Porque o Bom Fonseca, o Santos e o estádio são da mesma década, a segunda do século passado. Nasceram, sucessivamente, num intervalo de cinco anos, de 1911 a 1916.
Essa conjugação foi que nos fez, os filhos do casal, apaixonados pela cidade e pelo clube. E foi o que também nos tornou frequentadores assíduos da Vila, mesmo sem dinheiro para o ingresso aos jogos.
O curioso é que não recordo uma única vez em que estive com ele em dia de jogo dentro do “campo do Santos”, como então chamávamos Urbano Caldeira. Mas foram inúmeras as vezes que ele nos levou até lá, só pelo prazer de nos colocar no antigo espaço reservado aos “Meninos do Santos Football Club”, como se grafava na época. Missão cumprida, ele voltava para o chalé de madeira e, desconfio, para os braços da Bela Dolores.
Acompanhando a pelada de fim de ano dos filhos na praia
É provável que algum fonsequinha foi gerado na tarde de um daqueles domingos, ao som de um gol de Pepe narrado por Ernani Franco. O Santos da época, como os de hoje e de sempre, não cansava de fazer gols e o casal ia fazendo filhos: doze, contados os dois que não sobreviveram.
Estivemos juntos em vários jogos, mas no Pacaembu e no Morumbi. E aí era eu quem o levava, subindo penosamente a Serra do Mar em meu primeiro fusquinha. O Peixe era a alegria dele, ao lado da família. Era bonito ver sua felicidade na arquibancada, repetindo o adjetivo definitivo: o Santos é formidável. Tardes inesquecíveis.
Hoje, vou lembrar dele tentando me concentrar no seu caráter e no modelo de amor e honestidade que foi. Será difícil, porque foi dele mesmo a ideia de nos fazer tão santistas. No fundo, porém, nem há como separar sentimentos e valores. Pois as lições nos foram legadas pelo mesmo homem simples e bom.